quinta-feira, 7 de julho de 2011

Genero e Memoria Resumo

SUMO: O trabalho visa apresentar o resultado das atividades realizadas a partir da Olimpíada de Língua Portuguesa , onde entrelaçamos alguns dos saberes desenvolvidos por meio das aprendizagens obtidas com o Programa Gestão de Aprendizagem Escolar -GESTARII, estes programas propiciaram uma compreensão enriquecedora sobre os gêneros textuais e sua efetividade no ensino e aprendizagens no ambiente escolar. Assim, ao trabalhar com o gênero memória foi possível conhecer não apenas a historicidade do nosso município, como também aguçar os educandos pela busca do conhecimento. O tema lugar onde vivo, sugerido pela Olimpíada proporcionou uma reflexão local, levando-nos também a leitura do mundo. O trabalho possibilitou compreender as inúmeras possibilidades de organização de ensino que é possível construir em parceria com os educandos na tentativa de subverter o padrão tradicional de ensino. Neste âmbito, dialogamos com a vida cotidiana dos alunos, gerando novas probabilidades de conhecimentos e proposituras pedagógicas.
PALAVRAS-CHAVE: Gêneros. Leitura. Escrita.

I INTRODUÇÃO
Durante os Encontros do Programa Gestão da Aprendizagem Escolar – GESTAR II, que teve como meta inserir os educadores no processo de desenvolvimento da produção escrita, tendo como pauta as atividades pedagógicas desenvolvidas em sala de aula, discutimos sobre os trabalhos desenvolvidos nas unidades escolares com os participantes do Projeto Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, que abordou práticas concomitantes as propostas de trabalho com os gêneros textuais apresentados pelo programa GESTARII, tanto na disciplina de Língua Portuguesa como na de matemática, já que tratou de uma proposta de trabalho interdisciplinar. Percebendo a importância deste olhar, as professoras das escolas E.E São Geraldo e E.E 13 de Maio, no município de Porto Esperidião MT, trabalharam com o intuito de estimular a produção escrita e fazer com que os educandos percebessem que a leitura e, consequentemente, a produção textual requer uma prática desafiadora nas nossas escolas. Assim, observaram o quanto à leitura é importante na formação de cidadãos (leitores) críticos, tornando-os capazes, de compreender os acontecimentos do mundo que os cercam.
A partir da leitura do mundo o aluno pode compreender a realidade em que está inserido e chegar a importantes conclusões sobre a sua realidade e os aspectos que o compõem. Para Freire (1992, p.39), “a leitura é um processo que não se esgota na decodificação da palavra escrita”, mas se alonga na leitura do mundo que precede a leitura da palavra, linguagem e realidade se prendem dinamicamente. Portanto, a compreensão do texto a ser alcançada pela leitura implica a percepção das relações entre texto e contexto. Dessa forma o tema – O lugar onde vivo – da olimpíada de Língua Portuguesa proporcionou um momento de reflexão da realidade local, levando-nos, também a leitura de mundo, reforçada pelo programa GESTARII. É interessante ressaltar que quando o educador utiliza em sua prática pedagógica meios para que o educando possa compreender sua realidade, ele demonstra mais interesse e participação, aprendendo com maior facilidade e desprendimento.
Portanto, a finalidade deste trabalho é relatar as experiências de produção de textos do gênero memórias literárias, buscando referencial em teorias que tratam da efetividade de práticas diferenciadas no interior de nossas escolas, bem como, incita a produção textual tanto dos educandos como dos educadores. Essa possibilidade provém do fato de que a compreensão e produção escrita são dimensões sociais, culturais e psicológicas que mobilizam diversas capacidades de linguagem. Dessa forma o trabalho com o gênero - memórias literárias - possibilitou a compreensão de que os saberes da escola estão presentes no contexto da vida cotidiana.

II O CENÁRIO DAS ATIVIDADES
No desenvolvimento das atividades, realizaram-se perguntas aos alunos tais como: o que eles gostam de ler, indagações de quantos livros haviam lido, se lembravam das histórias e dos autores, se gostaram ou não e se conheciam o gênero memórias. Após averiguar que a minoria faz uso da prática de leitura e que não conheciam o gênero memórias literárias, foi proposto aos alunos a participarem da palestra realizada pelo senhor Geraldo Pereira Passos , um morador antigo e responsável pela fundação da Vila Bocaiuval, na qual ocorreu interação entre morador, alunos e professora, em uma agradável e animada discussão do relato e das questões levantadas no momento.
Para ampliar as narrativas da palestra, foi desenvolvido um roteiro de pesquisa de campo, no qual os educandos entrevistaram pessoas da comunidade. Enquanto isso, em sala de aula, desenvolveu-se atividades diferenciadas com a intenção de despertar nos alunos, o sujeito leitor que precisa ser aquele que busca compreender o mundo de maneira democrática e justa.
A leitura e as informações foram disponibilizadas aos alunos, desde o início da realização do trabalho com o caderno do professor da Olimpíada, juntamente, com a coletânea do gênero memórias literárias e outros relacionados. Nesse sentido, Marcuschi (2008, p. 154) diz que, “quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma lingüística e sim uma forma de realizar lingüisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”.
A palestra com o Senhor Geraldo foi uma metodologia de estímulo para aprimoramento do conhecimento do gênero. O palestrante explicou como foi à fundação do lugar onde mora, instigando e produzindo habilidades e desafios aos educandos. Pois, foi um momento onde surgiram variadas problemáticas, tais como: valorizar os saberes das pessoas mais experientes, compreenderem as características memórias literárias, perceber como objetos e imagens podem trazer lembranças de um tempo passado e conectar com o tempo presente, bem como observar que as memórias podem ser registradas oralmente e/ou por escrito.
Além da metodologia citada, visitamos a Casa da Cultura, num bairro próximo à escola para prestigiarmos uma exposição de antiguidades constituída de objetos e imagens, que pertenceram ao Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, que implantou as linhas telegráficas, nesta região, por volta de 1906. Os alunos entrevistaram o funcionário responsável pelo local e perceberam a possibilidade de, através das imagens e objetos antigos, relacionar o passado, antes desconhecido, com a realidade do presente.
Dessa forma, foi transmitido aos educandos que, compreender e produzir textos são atividades humanas que nos despertam para a compreensão do mundo, pois é na interação social que o gênero se torna significativo, é em sua concretização que expressa as diversas formas de comunicação, de entender e ser entendido, portanto, de imprimir significado a realidade em todos os sentidos possíveis.
Tendo em vista a importância da participação da comunidade, o trabalho disponibilizou conhecimento para a análise das leituras realizadas a partir do gênero memórias literárias, contribuindo com o desenvolvimento da análise interpretativa para o bom andamento da pesquisa de assuntos que julgávamos importantes, que circulavam na comunidade e, posteriormente, fariam parte da produção dos textos.
Em sala de aula focamos na escrita e na reescrita dos textos, com as professoras exercendo o papel de orientadoras, para se chegar ao texto final. Logo após, foi realizada a apresentação e a leitura dos textos tendo como referencial a organização da escrita. No desenvolvimento deste trabalho houve a reflexão acerca da prática de produção textual e sua articulação com a pesquisa de campo, na tentativa de ressaltar os avanços e os recuos no processo de aprendizagem.

III A PRÁTICA DA PRODUÇÃO DA ESCRITA
Ao fomentar a prática de escrita através da leitura do contexto buscamos inferir a necessidade de apresentar ao educando o universo inesgotável das palavras. Assim, os educandos serão capazes de realizar uma leitura proficiente de seu contexto e da diversidade que o compõe, logo, irão não só compreender o passado, como também poderão estabelecer relações entre outras épocas e a realidade atual. Isso pode ser percebido nos recortes a seguir, de um dos textos dos alunos.

O lugar onde moro chama-se Bocaiuval, é uma vila pequena com pouco mais de 750 habitantes, fica localizada no município de Porto Esperidião/MT. É uma vila pacata, tranqüila com pouco trafego nas ruas, não existe asfaltos nem saneamentos básicos. Porém, mesmo com a precariedade existentes por falta de muitos recursos é um ótimo lugar para se viver, os moradores são muito organizados, todos cuidam de seus lares com carinho.
Vivo aqui desde que nasci, há treze anos, confesso que, nunca antes tive a curiosidade de conhecer a origem e formação da minha terra natal só após a palestra que tivemos na escola com o palestrante Geraldo de Almeida Passos 2 um morador muito antigo do lugar e foi quem deu inicio a formação da vila é que me interessei em conhecer as raízes da comunidade. Seu Geraldo com seu relato emocionante nos conta como foi esta história, que começa mais ou menos assim:
“Bocaiuval era como a casa de Vinícius de Moraes, não tinha casas nem moradores, um lugar distante de tudo, onde ninguém queria morar.”
Confesso que fiquei satisfeito e feliz em fazer parte dessa bonita história. Garanto que estarei contribuindo no que for ao meu alcance para dar continuidade a esse trabalho de benfeitorias para nossa querida Bocaiuval
(depoimento do aluno Roberti Rodrigues da Silva)

É de grande importância salientar que, é necessário que haja um comprometimento não só por parte da Escola (professores), mas também um incentivo familiar, para que os alunos percebam que a leitura é o alicerce da interação da palavra com o mundo. A respeito dessa afirmação (CHIAPPINI, 2001, p. 22) nos mostra que “ao promover a interação entre os indivíduos, a leitura é compreendida não só como leitura da palavra, mas também como leitura do mundo. Deve ser atividade constitutiva de sujeitos capazes de interagir com o mundo e nele atuar como cidadão.”
As produções dos educandos nos fizeram compreender que a importância de os educandos viverem o passado reavivado em seu presente faz com que eles conheçam e se reconheçam como sujeitos ativos e transformadores do se próprio meio com a capacidade de transitar culturas ou propriedades de transferência da sua realidade, a escrita tanto pode promover intercâmbio como por em ameaça o poder constituído. Foi isso, aliás, que ocorreu na Idade Média quando a Igreja, numa atitude de censura, queimou vários livros e provocou a morte daqueles que se atreveram a lê-los, como nos mostra o Filme “Em nome da Rosa”.
Sendo assim, o resultado da proposta pedagógica ora descrita, buscou incentivar a leitura e a escrita de textos com o gênero memórias, buscando democratizar o acesso ao saber por meio da aproximação entre os saberes populares e os conteúdos específicos das disciplinas. Segundo salienta Freire (1992, p. 79):
Ler o mundo é ato anterior à leitura da palavra. O ensino da leitura e da escrita da palavra a que falte o exercício crítico da leitura e da releitura do mundo é científica, política e pedagogicamente, capenga desse modo, reafirma sua crença no homem enquanto produtor de sua história.
Ao trazer para o âmbito das salas de aula o gênero “memórias”, os educandos puderam trocar experiências e conhecimentos sobre a cultura local, bem como, implementar saberes sobre a leitura e a produção escrita. Além disso, ao examinarem “os sabores” da leitura e questionarem o texto, acreditamos que o aluno estará capacitado para criar e compartilhar novas interpretações acerca da realidade, dando-lhe novos significados. Assim, ele compreenderá que a realidade do mundo não é estática, ela se transforma, se modifica, é multifacetada e, por isso, o desafia a compreender o seu próprio processo de aprendizagem, que deve ser criativo e não repetitivo e imutável. Desse modo, entenderam que a leitura vai além de decodificar palavras, que ao ler os textos os levem a uma reflexão crítica sobre o texto lido, “[...] como atividade constitutiva de sujeitos capazes de interagir o mundo e nele atar como cidadão” (BRANDÃO E MICHELITII APUD. In: CHIAPPINI, 1998, p. 22).
A Olimpíada da Língua Portuguesa, Escrevendo o Futuro, possibilitou aos alunos a peculiaridade de conhecer melhor a modalidade do gênero memórias literárias para conduzir o aluno à transposição do oral para o escrito, sem traumas e respeitando o ritmo de aprendizagem de cada um, já que o professor tem à sua frente alunos reais, e não ideais. Já o programa GESTAR II, nos possibilitou transformar as práticas educativas propiciadas pela olimpíada em produção escrita dos educadores, buscando ressaltar a autonomia em criar novos processos de aprendizagem, bem como registrar e dar legitimidade aos trabalhos realizados em sala de aula.
Assim, foi possível realizar um trabalho de leitura, de interpretação, de palestra, de entrevista e de produção escrita, utilizando o gênero memórias com o tema “O lugar onde vivo”, ou seja, a partir de um gênero foi possível trabalhar com inúmeros mecanismos de aprendizagens, mostrando que a escola é um dentre os inúmeros espaços de saberes que temos na sociedade.
De fato o que somos e pensamos tem muito a ver com os fragmentos de cada discurso, de cada texto oral ou escrito, com os quais temos contato, seja por opção ou por algum tipo de imposição, como os apresentados pela escola. Cada discurso é, de acordo com Bakhtin (1997, p. 302), “um elo na cadeia organizada de discursos que nos constitui enquanto sujeitos”.

IV CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da abordagem exposta, notamos que a partir da prática da leitura e da escrita, o aluno (leitor) e o produtor (aluno) começarão a conhecer mecanismos que os auxiliaram, favoravelmente, a ser construtores do seu aprendizado. Dessa forma, ampliam sua visão de mundo; enriquecem seu vocabulário; conhecem os elos coesivos e a coerência textual, portanto, aprendem de forma dinâmica e produtiva os mecanismos da linguagem.
Trabalhar com gênero memórias foi muito gratificante, pois os alunos aperfeiçoaram o conhecimento sobre o gênero literário, por meio das diferentes atividades, as quais proporcionaram melhor entendimento através das leituras diferenciadas do mundo, os alunos melhoraram, consideravelmente, as interpretações e entenderam a necessidade da leitura crítica para que dessa forma o produtor (aluno) não acabe escrevendo de modo incoerente e superficial.
Enquanto docentes, a maior satisfação foi observar o resultado do trabalho que superou as nossas expectativas, pois, ouvimos dos alunos o quanto gostaram das aulas e das atividades realizadas, abordaram ainda que antes da palestra, nunca tiveram a curiosidade de conhecer o local onde vivem e que, após terem ouvido como ela fora construída, ficaram felizes em fazer parte da história do seu município, garantindo assim contribuir e dar continuidade aos trabalhos de seus ancestrais, no sentido de contribuir para a memória literária sobre o município.
Enfim, os alunos envolveram-se em um ambiente rico de socialização e demonstraram interesse em todo o processo do trabalho, contribuindo assim, de forma efetiva na realização do cronograma do projeto e nos resultados obtidos. Portanto, acreditamos que perceberam que a prática da leitura promove a habilidade essencial que é estabelecer suporte e relações entre as áreas do conhecimento e o universo no qual estão inseridos.

V REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética da Criança Verbal. 2ª. Ed. São Paulo, 1997.
CHIAPPINI,L.(Coord.). Aprender e ensinar com textos didáticos e para-didáticos. Vol. II. 2º ed.São Paulo: Cortez,1998.
CHIAPPINI, Lígia (Coord.). Aprender e ensinar com texto. 3. ed São Paulo Cortez, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
GNERRE, Maurizio. Linguagem, escrita e poder. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
MARCUSCHI, Luiz Anônio. Produção Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.